2024-11-21 14:49:34

Dylan sobe ao palco e não diz uma palavra. A plateia permanece em silêncio reverencial. O Royal Albert Hall, em Londres, se transforma em uma catedral, e estamos aqui para venerar o sumo sacerdote do rock: Bob Dylan.



Dylan começa a maioria das músicas em pé, cantando ao microfone, para então se dirigir ao piano de cauda, onde toca durante boa parte da noite.



A qualidade musical de sua banda é excepcional, com destaque para os guitarristas Doug Lancio e Bob Britt, além do lendário baterista Jim Keltner. O piano de Dylan varia entre tons de melancolia, paixão e intensidade marcante. E não podemos esquecer de sua harmônica, que permanece inalterada ao longo dos anos. Quando ele utiliza o instrumento, é como se fôssemos transportados de volta aos anos 1960.



Felizmente, metade do repertório apresentado por Dylan é composto por faixas de seu álbum Rough and Rowdy Ways, que, na minha opinião, é seu melhor trabalho em décadas. O material (o 39º de sua carreira) combina perfeitamente com sua voz rouca, profunda e quase falada, que substituiu o tom agudo e choroso de outrora; tão cativante à sua maneira. Por ser um trabalho recente, Dylan parece ainda não ter se cansado das canções, evitando o que alguns críticos chamam de “mutilação” de seus clássicos, algo que frequentemente ocorre em suas turnês.



Alguns clássicos, como “All Along the Watchtower”, que abre o set, e “It Ain’t Me Babe”, que vem logo em seguida, parecem ter ganhado nova vida com os ajustes de Dylan. Por outro lado, “Desolation Row” – uma de suas maiores obras – foi praticamente arruinada ao receber um tratamento de rock acelerado. A beleza dessa canção – como de tantos outros clássicos dos anos 1960 de Dylan – reside na forma como a música dialoga com a intensidade e as imagens poéticas das letras. Infelizmente, na interpretação atual, essa magia se perde. Ainda assim, quando a música termina, a plateia explode em aplausos incessantes por vários minutos. Mas é difícil não sentir que esses aplausos são para a memória da canção que Dylan apresentou décadas atrás, e que impactou tantas pessoas, e não para a versão que ouvimos agora.



Outro aspecto interessante do show é a ausência de artifícios. Nada de luzes brilhantes e chamativas, pirotecnia ou dançarinos performáticos – algo que, infelizmente, muitos astros do pop e do rock hoje consideram indispensável. Ainda assim, acredito que a adição de backing vocals femininos poderia ter trazido um contraste mais luminoso à densidade de Dylan.



Conforme o show avança, destacam-se performances de “It’s All Over Now, Baby Blue” – do álbum Bringing It All Back Home (1965) – além de “I’ve Made Up My Mind to Give Myself to You” e “Goodbye Jimmy Reed”. Dylan encerra a apresentação com “Every Grain of Sand”, do álbum Shot of Love (1981).



O concerto, que começou às 20h, termina às 21h45. A plateia, extasiada, pede: “mais um”, mas é em vão – Dylan não faz bis.

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